terça-feira, 30 de agosto de 2011

oitocentos e quarenta e três. em cada esquina. "para meter órde neste país".


Não são de espantar os quase cinquenta anos que este país esteve sob jugo salazarista. O Dr. Salazar, como os aliens do They Live!, também nos mandava obedecer, casar e reproduzir (ou obedexer, caxar e reproduxir, pois não concebo nenhum admirador do Salazar que não fale axim e que não viole ovelhas numa média de três por semana), mas literalmente, e sem subterfúgios publicitários, ou, como se dizia na altura, "António Ferro". A insídia hipnótica daquela voz de seminarista, a par de uma capacidade oratória sem par, transformava qualquer anti-corporativista em súbdito das Casas do Povo, e daí eu não me ter espantado quando ao fim dos dez minutos iniciais de Fantasia Lusitana eu já me ter metamorfoseado em menino da mocidade portuguesa, com o general Carmona, ao meu lado, a acariciar as minhas pernas de veludo, o grande babão. Os discursos do "maior português de todos os tempos" (para mulheres de buço, padres pedófilos, taxistas, taberneiros e o blogue 31 da Armada) e poster abundante na cave do Dr. Rui Ramos não constituem, todavia, a única cousa digna do meu interesse no filme de João Canijo, pois também há por lá a melhor interpretação de sempre e ao vivo da "Saia da Carolina", com geniais planos à Leni a acompanhar, e ainda os tão hilariantes quanto extraodinários panfletos de propaganda a propósito de qualquer inauguração a cargo do Dr. Presidente do Conselho e da sua excepcional capacidade geopolítica, que nos salve a todos dos horrores dos sindicatos, aleluia. Apesar disto, fiquei a saber o mesmo sobre o delírio lusitano de tempos idos, um país a brindar as alegrias e espantos do estrangeiro (famoso) perante as coisinhas bonitas do país (como o pastel de Tentúgal). A catadupa de imagens parece ter sido escolhida num jogo de dados, e isto já para não referir a impossibilidade de prestar atenção máxima ao bailado extenuante das palavras e suas imagens, pois embora tenha nascido no século XX, o meu olhar está mais perto da lassidão dos humanos medievais. Curiosa radiografia do Portugal dos piquenos, mas por aqui prefere-se o grande Canijo ficcional.

sábado, 20 de agosto de 2011

"anda cá que o pai unta-te. "


"Adoro cús e mamas". Isto disse o Verhoeven (quase Deus) na altura da estreia do Showgirls. Imagino-o a babar-se todo para cima do micro e com a mão dentro do bolso. Go Go Tales é o adoro cús e mamas do Ferrara (Deus, por Bad Lieutenant e o Invasion of Body Snatchers, o melhor filme "sci-fi" dos anos noventa, a par do Starship Troopers), um mostruário de belíssimas peidas, tetas formosas e menos formosas, maquilhagem, sensualidade e javardice, com a câmara escarrapachada nos corpos, num rodopio desconcertante de sons e imagens, pegando numa personagem, deixando-a em nenhures e pegando noutra, e torna-se óbvio que o Abel andou a ver obstinadamente o Noite Escura do Canijo, na sua apropriação (fiel? nunca foi a nenhum) do ambiente alternadeiro . Mas Go Go Tales não é só isto, seus tarados. Também me disseram que é uma "comovente homenagem à resistência do indivíduo face ao poderio do soberano Dinheiro", e "qualquer coisa o Cassavetes e o The Killing of Chinese Bookie sim senhor". Eu cá gostei.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Cinema em modo férias

Pois bem, passaram-me dois filmes pelas vistas: revisão de "Harold and Maude", que continua com uma certa graça, mas que cheira a mofo como tudo (como muito cinema dos louváveis, maravilhosos, adultos anos 70 e quase todos os Hal Ashby, a maior parte dos quais nunca vi?); e um filme, jesus cristo, chamado "O ano em que os meus pais foram de férias", de um tal brasileiro-alemão chamado Cao Hamburger (espero que o tipo tenha sofrido de bullying q.b. com este nome e como futuro realizador de merda) e que é nada menos do que terrível, em que até há a mais originalíssima de todas as originais vozes off, que começa e acaba da mesma maneira. Para juntar àquela merda da Suely. Eu que não achei piada ao Bressane, prefiro ver 20 vezes qualquer um filme dele a estas genialidades. Continuo de férias. Próximo post: Bud Spencer.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

fast food.


A História da Humanidade desenrola-se por modas. Houve a moda de lascar paus e a de fazer fogo com os mesmos, a moda dos faraós e dos filósofos gregos, a de ir tomar banhos em termas e a de migrações bárbaras que acabaram com o Império Romano, ou ainda mais comezinhas como a de usar calças à boca dél sine, etc, etc. Actualmente sobressaem os reinados do Poker e, no panorama áudiocagalhão, o dos programas de comida, vulgo "programas com chefs de cozinha e seus alimentos moleculares espumosos para deixar de boca à banda qualquer sujeito que meta os costados no Eleven ou cujo maior sonho na vida é ser enrabado pelo Ferran Adrià no El Bulli". Se o primeiro não me interessa, até porque sei ler e escrever, já o segundo diz-me muito, pois gosto de comida, gosto de ver gente a cozinhar e gente a comer. Vi um episódio do Hell's Kitchen e ia chamando o INEM. É um programa de comida onde se tem aversão aos alimentos e às suas texturas. Mal surge um plano de um trata-se logo de encarreirar para outro, numa montagem Tony Scottiana (uma rameira audiocagativa que é muito, mas muito pior do que o irmão, ao contrário do que muito boa gente pensa, e que, estranhamente, começa a ver aos poucos as suas bostas incensadas por qualquer ordem pós-moderna e coiso) susceptível de estilhaçar as lentes mais poderosas. A câmara cospe, há por lá um cabrão que também cospe como se fosse a reencarnação do sargento do Full Metal Jacket e parece que há choros e modos desesperados. É, a par do Dia Seguinte, o pior programa da história do áudioVasconcelos. Vi uns minutos do Master Chef e, embora afastado da cacofonia do outro, também há rapidez a mais. Não vale um décimo dos velhos programas da Vacondeus ou do Chef Silva: comida numa mesa, plano fixo com enquadramento ao centro, e cá vai disto. Uma vez bati uma a ver um programa do Chef Silva. E em pequeno devorava com os olhos um livro do Chef Silva. Parece que o estou a ver, de barrete branco e cara bolachuda (o Silva, não o livro). No Reservations, pese embora o delírio da comida exótica, do retrato de comunidades sociais e económicas, da possível hilaridade das situações e do carisma do Bourdain, também resvala para uma moderada epilepsia filmica. O cheiro a medo de ser chato e entediante deve cagar de alto a baixo as calças dos produtores, realizadores e montadores destes programas. Estes cretinos deveriam ter estado no plateau do Hereafter, no momento em que o Eastwood se preparava para fazer milagres com o Damon, a filha do Ron Howard e mais umas guloseimas de que já não me lembro. Comia agora 70 croquetes.

a merda.

O Vitor Belanciano, no seu artigo sobre aquele sujeito eslovaco ou esloveno, escreveu duas vezes merda. Duas vezes. Já não ficava tão chocado desde que tive conhecimento da amizade da Paula Bobone com o Max Monteiro.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

o Dennis Farina entrou numa das melhores séries dos anos oitenta, o "Crime Story", do Michael Mann.


Treze anos depois da sua estreia vejo, finalmente, o filme que relançou a carreira de Steven Soderbergh (o único realizador que conseguiu filmar Sasha Grey sem lhe captar o pito) e que iniciaria o seu ziguezague entre objectos "experimentais" e coisas "comerciais". Confirma-se, em retrospectiva, a coisa que mais me agrada no cinema deste tipo: a sua aversão a histerismos de qualquer espécie, sejam formais (mesmo quando a câmara "mexe") ou literalmente verbais (mesmo quando as personagens gritam parece que o fazem sempre com classe, uns Aimares ou uns James Rodriguez do grito), esteja a tratar de ladrões de casinos ou de revolucionários comunistas, e o Soderbergh poderia até colocar o Guevara do Del Toro na acção do Oceans' Eleven que ninguém daria por isso, tal é o ponto comum da coolness entre as suas personagens. Em Out of Sight o mais notável exemplo deste relaxamento é a cena do Clooney e a Lopez na bagageira do carro, espécie de screwball comedy ao ralenti. Cineasta do décor e do detalhe, com "muito cinema" no seu âmago (mamã, não quero tanto cinema!), um filme deste sujeito nunca me parece desinteressante e este, em particular, é daqueles para se ver com um charuto na boca e um copo de martini na mão, algures num hotel numa ilha "paradisíaca" e rodeado por uma menina em bikini. Já posso abrir a boquinha, sugá daddy? Caluda, puta, que estou a ver um Soderbergh.