Post Tenebras Lux começa com uma sequência de maravilhamento infantil pelas "coisas lindas" da natureza, com os rebordos do enquadramento em permanente blur, algo que vai estar sempre em evidência até ao fim, não se sabe porquê. Depois aperece um demónio com uma caixa de ferramentas. E depois começa o filme. E quando começa o filme, o Reygadas quer criar mood, que fazer o "espectador pensar", perdido num puzzle de sequências com vagos pontos de contacto entre elas, para mostrar que a narrativa tradicional é uma filha da puta que só os imbecis poderão abraçar. Há gordos e caralhos de gordos (já em Batalla en el Cielo os havia, isso é fetiche, Carlinhos?), pinheiros a cair, assaltos, e uma gaja que não quer apanhar no cu. Não passa nada da cabeça do Reygadas para o espectador, ou seja, eu. Não é tão irritante como esperava, apenas tão indiferente como olhar para um quadro preto exposto numa floresta negra à meia noite sem lua no céu (apesar das duas primeiras sequências).
A melhor actriz do mundo mete-se no colete de forças de Camille Claudel e depara-se com um maralhal de deficientes, desdentadas e directores de prisão que parecem mortos-vivos. Filme de grande solidão e de não poucos silêncios, quase sempre a fazer do rosto da Juliette a chama dos seus encantos. Rosto que serve para um ou outro momento discutível, quando o Dumont enquadra Claudel com um plano fixo de uma das desdentadas-tolinhas lá do sítio. A empatia surge no filme, com um diálogo entre as necessidades mundanas de Claudel e as correntes divinas do seu irmão. Pão e lareira vs Deus Nosso Senhor. Escusado será dizer por quem torcemos.
Pain and Gain é o mais próximo que Michael Bay estará de fazer um filme para maiores de nove anos ou para quem tenha q.i superior a 15. Uma espécie de prolongamento da inesquecível sequência do Boogie Nights em que o mesmo Wahlberg, o John C. Reilly e o Thomas Jane se enfiam na casa do Alfred Molina, com uma tensão e um humor a raiar o negro que jamais suspeitariamos que o Bay fosse capaz de manejar. O arsenal habitual está lá, mas esse nunca foi o grande cancro do Michael: a ausência de tempos mortos ditada pelo estilo Bay, algo como um TGV sem travões, faz grandes encantos por aqui, a que se poderia acrescentar o diálogo surdo entre o american way of life (que Bay eleva em todos os seus filmes) e uma sua crítica, algo que suspeitamos que tenha escapado ao próprio gajo. Dwayne Johnson é Deus.
The Lone Ranger seria entretenimento meramente comestível e sem grande dano para a saúde, senão tivesse Depp e um genérico final que é uma maravilha. É verdade que já vimos este Depp naquela coisa dos piratas e nuns quantos Burtons, mas o que é bom nunca cansa, e antes ver esta repetição eterna a saborear pela primeira vez qualquer coisa que tenha Joss Whedon no nome. Quanto ao genérico final, e que dura aproximadamente onze minutos (cada vez mais longos, autênticas curtas-metragens), é já o mais belo do cinema americano desde o do Gran Torino. Depp é Deus.
Há filmes tão miseráveis que é com grande prazer que escrevemos sobre eles. Man of Steel tem dois dos maiores cagalhões do cinema actual nos seus comandos, e o que podemos dizer que é nenhum deles deixa por cu alheio as suas credenciais. O filme é meramente uma merda até ao último terço, com desvirtuação da mitlogia supermaniana para se mostrar que no cinema dos blockbusters também há lugar para estas "inovações"; até aflige a ausência de qualquer tipo de irrisão nisto. Mas é a partir da luta final entre o homem de aço (inútil Henry Cavill) e o Zod (Michael Shannon é Deus) que o nosso coração brilha de alegria perante tanta nojice filha da puta: 20 minutos (ou três horas, não importa) de pancadaria ininterrupta ditada por uma montagem de alguém que faz o Bay ou o Tony Scott parecerem meros aprendizes de Bresson, sem qualquer plano que tenha um grama de peso, meu filho da puta Snyder e meu cabrão Nolan, não há quem vos faça a folha? E o plano do Superman depois de enviar para os anjinhos o Zod, um grito de desespero e de sacrificio, ui, tanto peso na alma e tão torturado que ele é? E, ainda pior, o que fizeram à Diane Lane, com uma maquilhagem fantasmagórica de prisoneira numa cela para lesbianas? Filme bom para jovens passarem por eruditos e dizerem, enfatuados, "eu gosto é de filmes complexos, como o Man of Steel" .Sois uns filhos da punheta.
O George Costanza dizia que numa reunião de trabalho era capaz de ter uma ou duas observações, mas que no final estavam enterradas num vasto oceano de banalidades e gaffes. The Innkeepers quase consegue tal desiderato, e só não o alcança na plenitude, porque os seus bons momentos são tão bons que quase fazem esquecer toda a porcaria inane que por ali vai, desde uma Kelly McGillis saída de um manicómio a comédias completamente descabidas, passando por esse verdadeiro horror que é o momento em que a Sara Paxton vê o seu colega punheteiro em plenas cuecas, cheias de sumptuosa nanha, desconfiamos. Mas há por lá, também, a Sara Paxton sozinha no hotel a tentar captar sons do além, lembrando-nos o Travolta do Blow out, ou a Sara e o punheteiro na cave, em que o Ty West nos dá a não-ver um dos grandes não- contracampos dos últimos tempos, para grande terror do punheteiro de óculos (o do filme, não eu). Ty West, dá para ver, é alguém com certo talento para estas ambiências de medo, mas que se deixe de comic reliefs e demais caralhadas.
Um homem com h grande define-se em certos momentos, e um deles, e talvez um dos mais difíceis, é admitir que gostou (e não pouco) de um filme da filha do Coppola. O seu cinema de pochette e sapatinho tem aqui o seu verdadeiro ponto de equilibrio natural, pois não há quase mais nada que pochettes, pulseiras, sapatinhos, fúteis betinhas, casacos, etc. A sua recusa em escavar as razões do comportamento desta pitolândia é outro grande plus, bem como o carácter repetitivo do filme, passado ora entre roubos ora em esfuziantes clubes nocturnos ao som de ritmos da moda. É uma maravilha de superficialidade e de amoralidade que é sempre bem-vinda nos nossos corações. Emma Watson é Deus.
The Conjuring, colheita James Wan, sucede ao inane Insidious, e sucede bem. Filme com a originalidade de uma fotocópia 456 de um documento do Ministério das Finanças, e nós ralados: barulhos de portas, caves, relógios grandes, mulheres vestidas de noiva (obs: em Innkeepers também há e em Insidious também havia fantasmas de noivas; será uma espécie de horror subsconciente pelo casamento?), bonecos de ventríloquos e demónios com voz à Bruno de Carvalho (nunca há demónios com, digamos, a voz da Joan Fontaine), mas com o método slow-burning sempre criteriosamente mantido em tonalidades bem dignificantes para os nossos neuro-transmissores. O payoff é rotina, mas até lá há uma paciência que apreciamos, apesar dos clichés (inevitáveis, diga-se). Lilly Taylor é Deus e Vera Farmiga é Deus.
Hannah Arendt é um bom filme para o António Guerreiro fazer textos no ipsilon. É a banalidade do mal transformada em banalidade no cinema, um cinema inerte e de escuteiro meirim muito bem comportado e respeitoso. Não é um telefilme completamente inútil, pois ficamos a saber que a Hannah apanhava palmadas no cu e recebia visitas nocturnas de um entesado e pervertido Heidegger (numa série de nulos flashbacks). Aquilo que já se sabia sobre o caso Arendt -Eichmann-judeus raivosos fica-se a saber na mesma, sem qualquer contraponto cinematografico que justifique este tempo perdido. Resta-nos Barbara Sukowa, sozinha, a fumar. Há nesses momentos mais vida que nos outros minutos todos juntos.
Seth Rogen, Michael Cera, Jonah Hill, foda-se. Até apanho lepra só de ver esta maltosa, que nem consegue ser contrabalançada pela presença do grande Franco, da Rhianna e da Emma. Punhetas, charros, peidos, gajas boas, punhetas, mais charros, drogas, punhetas, peidos: é o costume, apenas travestido pela imbecil iconografia do fim do mundo. Já no céu, há punhetas, charros, cocaína, gajas boas e peidos. A única coisa boa nisto é dar-nos a possibilidade de imaginar estes caralhos (à expecção do Franco) todos a serem vítimas de um verdadeiro fim do mundo e a levarem grande sumiço. Sobretudo o Rogen e o seu "sorriso melancólico". James Franco é Deus, Rhianna é Deus, Emma Watson é Deus.