E Dario, na sua demência, teve uma ideia: colocar, por debaixo dos olhos do espectador, alfinetes colados a fita adesiva, para o obrigar a não desviar o olhar perante o abundante jorro de gore. Por razão desconhecida, o processo jamais entrou em acção, mas Argento tratou de o incorporar no rejubilante e febril Opera, filme de contornos de pura ilógica (mesmo para o standard do cineasta), com um final, sobretudo, proveniente de um universo paralelo, cujo GPS estará algures entre o seu filme anterior, Phenomena, o Sound of Music e a casa de férias de Hitler na Baviera. Por entre o absoluto terror de ter de olhar ao de não puder olhar, Opera deve ser um dos filmes com mais close ups de olhos, iniciando-se tudo com um de um corvo, exemplo de bicharia justiceira e com amor pela ordem das cousas; na mais imaginativa e sensacional morte, Daria Nicolodi encosta um dos seus olhos a um buraco de fechadura, e depois é material que muuto justamente deveria ser lendário a nível das "histórias do cinema" (aliás, estamos a elaborar um projecto, intitulado "The Story of Film: let's make some name dropping", e que durará 25 horas, onde este momento em Opera será devidamente enquadrado com um excerto de um excerto de um excerto de um texto de Roland Barthes, singelamente intitulado "João Lopes"). E como perverso que é, Dario embrulha o horror num romantismo ingénuo (Cristina Marsillach, séxe e angelical- apenas beijinhos), o que resulta em grande fervor dramático, com grande relevo para uma banda sonora onde se alterna hard rock à Iron Maiden e épicas lullabys instrumentais de Simonetti e Wyman (cuzinho lambido, de bom grado) carregadas de luminosidade "inocente". E um filme onde uma das personagens tem de se passar por puta sádica para se salvar, passando por uma câmara que quase parte ao meio diversas personagens, tem de ter sempre qualquer coisa de especial.