Para angariar os meus mais básicos níveis de simpatia, um filme que tenha data de produção pós-2005 (também pode ser 2004 ou 2006) tem de possuir, para começar, duas cousas em franco desuso nos dias de hoje, dias do “há que prestar primeiro atenção ao sentir do mundo contemporâneo”, escola do Professor Shambu: um trabalho de composição com peso, conta e medida e uma aplicação esparsa de sons fora da órbita interna do filme (isto é, parem de martelar música a despropósito; umas vezes uma pessoa quer ouvir o som de umas botas a enterrarem na terra e só ouve a merda da música). Como sou homem modesto, de pequenos prazeres, essas duas características do filme já me elevam a moral e não me fazem abdicar da visão do mesmo ao fim de 15 minutos. O “Os Conselhos da Noite” possui as duas matérias em questão, portanto, o meu agrado com o filme começa aí. A música, ambiental e ocasional, está nos “sítios e tempos corretos”, jamais entrando pelo filme adentro como um bulldozer numa loja de memorabilia cinéfila, e os planos, todos de fação clássica, de escala média ou geral (ou super-hiper-geral, como no magnífico plano de abertura), estáticos ou com leves movimentos de câmara, com recurso limitado ao campo/contracampo entre personagens: está tudo muito bem, só não estando “tudo” bem porque há lá uma correria num jardim com suspeitosos cortes e tons malickianos (salve-se quem puder!). Mas deixemo-nos dos amantes em fuga pelo jardim, e continuemos nos prazeres, começando pelo humor corrosivo e hilariante nos vários tablexaux que se vão espraiando pelo filme, desde aquele em que um jovem debita uma miríade de clichés sobre as virtudes do bem vestir e do empreendedorismo até a uma sequência after hours numa roulote que não estaria mal como uma das deleted scenes das sequências texanas do “Wild At Heart”. Ou ainda uma história de um hambúrguer cortado com faca e garfo ao balcão (em Nova Iorque, nos anos 90, era assim que se cortavam os snickers).O Tiago Aldeia, ao ralenti, tanto na forma de se mover como de se expressar, está em sincronização perfeita com o ritmo cadenciado e relaxado da obra (jamais esquecer palavras eternas do Kiarostami: "gosto de filmes que me ponham quase a dormir"), ritmo esse sempre uno, mesmo com as alterações de registo que vão acontecendo. Há tempo e espaço para se apreciar a duração de beber um copo de tinto, um café ou um whisky. Há duas das mais estonteantes dançarinas de dança do ventre na “magia da história do cinema “ . Um jantar familiar bem regado e com broa da boa sintetiza em pouco mais de um minuto as dinâmicas e os ressentimentos entre o protagonista e os pais. O filme continua e nós de corpo entorpecido. Os céus enevoados de Braga, que melhor não ficariam com recurso a digitalizações. Passamos dos sagrados silêncios das igrejas e mosteiros para uma palhaçada electrónica na noite da cidade, mas nem damos por isso: continuamos distendidos. Quando damos por nós, acaba o filme. E temos pena de ter deixado de fumar, pois um café, um cigarrinho e um copo de whisky, depois de se ver “Os Conselhos da Noite”, decerto que nos proporcionaria tanto ou maior prazer do que aquele que teríamos em ter uma dança particular de cada uma das meninas da dança do ventre.
quarta-feira, 23 de setembro de 2020
domingo, 20 de setembro de 2020
Mais vinte obras-primas (ou muito perto disso) vistas ou revistas (mais ou menos) recentemente:
1.Jovens interpretando escravas retardadas do excremento Charles Manson. 2.Dakota Fanning. 3.Margaret Qualley. 4.Sharon Tate. 5.Margot Robbie. Once Upon a Time in Hollywood (2019). Quentin Tarantino
Filme: 4/5
Kotomi Kyôno. Takeshis' (2005). Takeshi Kitano
Filme: 4/5
Candace Hilligoss. Carnival of Souls (1962). Herk Harvey
Filme: 3/5
1.Jessica Alba. 2.Ashley Scott. Into the Blue (2005). John Stockwell
Filme: 1/5
1.Alice Isaaz. 2.Noémie Merlant. 3.Lola Le Lahn. Un moment d'égarement (2015). Jean-François Richet
Filme: 3/5
1.Marilù Tolo. 2.Sophia Loren, Matrimonio all'italiana (1964). Vittorio De Sica
Filme: 3/5
Briony Behets. Long Weeekend (1978). Colin Eggleston
Filme: 4/5
1.Beatriz Batarda. 2.Inês de Medeiros. 3.Júlia Britton. Tempos Difíceis (1988). João Botelho
Filme: 4/5
Karen Colston. Sweetie (1989). Jane Campion
Filme: 3/5
Cristina Aché. Vereda Tropical (1980). Joaquim Pedro de Andrade
Filme: 3/5
quarta-feira, 16 de setembro de 2020
domingo, 13 de setembro de 2020
Mais vinte obras-primas (ou muito perto disso) vistas ou revistas (mais ou menos) recentemente:
Pamela Tiffin. Summer and Smoke (1961). Peter Glenville
Filme: 2/5
Olga Kurylenko. The Death of Stalin (2017). Armando Iannucci
Filme: 2/5
1.Alexandra Hay. 2.Jacqueline Mille. 3.Anouk Aimée. Model Shop (1969). Jacques Demy
Filme: 4/5
Lorraine Bracco. Goodfellas (1990). Martin Scorsese
Filme: 5/5
Dianne Wiest. September (1987). Woody Allen
Filme: 4/5
1.Joan Cusack. 2.Lili Taylor. 3.Bebe Neuwirth. 4.Ione Skye. Say Anything... (1989). Cameron Crowe
Filme: 1/5
1.May Winn. 2.Dianne Foster. 3.Barbara Stanwyck. The Violent Men (1955). Rudolph Maté
Filme: 2/5
1.Ludivigne Sagnier. 2.Charlotte Rampling. Swimming Pool (2003). François Ozon
Filme: 4/5
1.Catherine Oliviere. 2.Nora Mullins. 3.Emily Robinson & Elsie Fisher. Eighth Grade (2018). Bo Burnham
Filme: 4/5
SHBBWLM (Sexy, Hot and Beautiful Black Women Lives Matters). Xala (1975). Ousmane Sembene
Filme: 5/5
quarta-feira, 9 de setembro de 2020
O Massacre do Cinema.
O nascimento de mais um/a "progressista"
Filho dá boas novas ao papá:
-Papá, vou fazer cinema!
Papá olha para o filho, coloca os óculos na mesinha junto ao sofá, e pousa o jornal no regaço. E pergunta ao filho:
- És negro?
- Não, papá.
- És gay?
- Não, papá.
- És mulher?
- Não, papá...
- És maneta?
- Não, papá...
- És do PAN?
- Não, papá...
- És transsexual ?
- Não, papá!!
- Achas o Steve McQueen um dos piores realizadores da história do planeta Terra?
- Acho, papá!
Papá pára de questionar. Volta a colocar os óculos e volta a ler o jornal. Sem olhar para o filho, e num tom grave, questiona:
- Então vais fazer cinema para quê, pá?
Surge a mamã, de avental.
- Então, que se passa?
- É o teu filho caucasiano, heterossexual, e não apreciador de enormes cineastas da história do cinema que quer fazer filmes!
Mamã prostra-se no sofá, chorando. Papá, sem se deter na sua leitura:
- Estás contente com o que conseguiste?
Filho vai consolar a sua pobre mamã e reflecte na pura ilusão burguesa das suas aspirações artísticas. De noite, para se expurgar de tamanhas indolências, irá ouvir a discografia completa de Beyonce Knowles e rezar dez avés marias a Alexandra Ocazio-Cortez.
PS: Se um filme do Botswana se candidatar a melhor filme, terá de ter na sua equipa técnica uma determinada percentagem de brancos?
domingo, 6 de setembro de 2020
Mais catorze obras-primas (ou muito perto disso) vistas ou revistas (mais ou menos) recentemente:
Iulia Ciochina. Comoara (2015). Corneliu Porumboiu
Filme: 5/5
Emmanuelle Seigner. J'accuse (2019). Roman Polanski
Filme: 3/5
1.Sheila Vand. 2.Alison Brie. The Rental (2020). Dave Franco
Filme: 2/5
1.Diane Lane. 2.Diana Scarwid. Rumble Fish (1983). Francis Ford Coppola
Filme: 4/5
Melissa Leo. Streetwalkin' (1985). Joan Freeman
Filme: 3/5
Margit Carstensen. Angst vor der Angs (1975). R. W. Fassbinder
Filme: 4/5
1.Lee Remick. 2.Joanne Woodward. The Long, Hot Summer (1958). Martin Ritt
Filme: 3/5
Emily Ratajkowski. Welcome Home (2018). George Ratliff
Filme: 1/5
1.Noémie Merlant. 2.Adèle Haenel. Portrait de la jeune fille en feu (2019). Céline Sciamma
Filme: 1/5
Dianne Foster. The Last Hurrah (1958). John Ford
Filme: 5/5
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